José
Aristides da Silva Gamito[2]
1. CONCEITUAÇÃO E TAREFA DA TEORIA DO
CONHECIMENTO
A Teoria do Conhecimento é uma investigação
sobre a origem, extensão e limite do conhecimento. Outros nomes são tidos como
equivalentes a esta disciplina como epistemologia, gnoseologia. Segundo Carvalho, a epistemologia e a teoria
do conhecimento têm finalidades diferentes:
Por estar diretamente ligada aos problemas da
ciência e do conhecimento, às vezes a epistemologia foi confundida com a teoria
do conhecimento. Entretanto devemos evitar este equívoco, pois, enquanto a
teoria do conhecimento sempre fez parte da filosofia, ao longo de sua história,
procurando tratar do problema do conhecimento humano como um todo, o termo epistemologia
só foi utilizado, no final do século XIX, inicialmente por alguns membros
do “Círculo de Viena”, que usaram o termo para designar os estudos
especificamente voltados para problemas das ciências empíricas (CARVALHO, p.
14).
Porém, estas diferentes acepções não estão bem
convencionadas. Abbagnano diz que as diferenças possuem mais razões
linguísticas:
Em italiano, o termo mais usado é gnoseologia. Em
alemão, o termo Gnoséologie, cunhado pelo wolffiano Baumgarten, teve
pouco sucesso, ao passo que o termo Erkenntnistheorie, empregado pelo
kantiano Reinhold (Versuch einer neuen Theorie des menschlichen
Vorstellungsvermögens, 1789) foi comumente aceito. Em inglês, o termo Epistemology
foi introduzido por J. F. Ferrier (Institutes of Metaphysics, 1854)
e é o único empregado comumente; Gnoseology é bem raro. Em francês,
emprega-se comumente Gnoséologie e, mais raramente, Épistemologie. Todos
esses nomes têm o mesmo significado...(ABBAGNANO, p. 183).
Em síntese, a Teoria do conhecimento tem
por objetivo buscar a origem, a natureza, o valor e os limites da faculdade de
conhecer. (JAPIASSU).
2. HISTÓRIA DA TEORIA DO CONHECIMENTO
Na
Antiguidade e na Idade Média não se pode falar de uma Teoria do Conhecimento
como uma disciplina específica da filosofia. Platão e Aristóteles desenvolveram
numerosas reflexões epistemológicas, mas a autonomia desta disciplina só
aparece na modernidade. John Locke é o primeiro a abordar de
modo específico e sistemático sobre o problema na sua obra “Ensaio sobre o
Entendimento Humano” (1690).
Em
seguida, outros escreveram tratados específicos: Leibnitz (1765) escreveu “Novos Ensaios sobre o Entendimento
Humano” refutando as ideias de Locke. Berkeley
escreveu em 1710 o “Tratado dos Princípios do Conhecimento Humano”; Hume escreveu “Investigação sobre o
Entendimento Humano”, em 1748.
Depois,
Kant em sua “Crítica da Razão Pura” (1781) faz uma crítica do conhecimento,
cujo método ele chama de ‘método transcendental’.
2. PROBLEMAS DA TEORIA DO CONHECIMENTO
2.1. 1º PROBLEMA: O QUE SE PODE CONHECER?
O primeiro problema do conhecimento que se
coloca em discussão é a sua possibilidade.
Existem várias posturas em resposta a este problema:
Dogmatismo: É a
posição que admite uma verdade absoluta além do ser humano, além do espaço e do
tempo, que pode ser acessada pelo intelecto. Para o dogmático é evidente que o
sujeito pode apreender o objeto pelo ato cognitivo.
Ceticismo: É a
postura de quem afirma que não é possível saber se pode ou não conhecer um
objeto/ente. Não há negação total, apenas dúvida sobre a possibilidade de
conhecer. O sujeito não pode apreender o objeto. Estamos impossibilitados de
formular juízos.
Subjetivismo:
Esta postura sustenta que há uma verdade, mas ela tem validade limitada, está
limitada ao sujeito que conhece e a julga.
Relativismo: É não aceitação de verdade
absoluta, universalmente válida; toda verdade é relativa, apenas tem uma
validade limitada.
Os sofistas são os primeiros relativistas. O
princípio de Protágoras (séc. V a. C.): “O homem é a medida de todas as
coisas”.
Pragmatismo: É uma modalidade positiva
do ceticismo. Esta postura não admite a concordância entre o pensamento e o
ser. E supera a negação intrínseca do ceticismo com um novo conceito de
verdade. Verdadeiro é o que é útil. Os pragmatistas entendem que o homem é um
ser prático.
William James (1842-1910) é considerado o
fundador do pragmatismo. Encontrou adeptos na Inglaterra e também na Alemanha.
O voluntarismo de Nietzsche se coaduna com esta postura: “A verdade não é um
valor teórico, mas apenas uma expressão para designar a utilidade, para
designar aquela função de juízo que conserva a vida e serve a vontade do
poder”.
Criticismo:
Esta postura assume uma posição intermediária entre dogmaticismo e ceticismo.
Admite que é possível conhecer, que existe uma verdade. Porém, exige um exame
de todas as afirmações da razão, nada pode aceito despreocupadamente.
Kant
é o fundador do criticismo, sua filosofia é um exame do dogmatismo e do
ceticismo: “O método de filosofar consiste em investigar as fontes das próprias
afirmações e objeções e as razões em que as mesmas assentam, método que dá a
esperança de chegar à certeza”.
2.2. 2º PROBLEMA: QUAL É O OBJETO DO
CONHECIMENTO?
Segundo
Platão as ideias que são o objeto do conhecimento, através da consciência delas
é que possuímos a ciência verdadeira (epistemh).
Do mundo físico só possuímos opinião (doxa).
O
objeto do conhecimento suscita a discussão sobre os universais. Desde a
antiguidade que já se pergunta pelo objeto do conhecimento, mas é na Idade
Média com a discussão dos universais é a discussão ganha sistematização. As
propostas estão assim formuladas:
Realismo:
Os universais possuem existência no pensamento (transcendentalmente) ou nas
coisas (imanentemente).
Nominalismo:
Tudo
que existe são particulares, não admite a existência dos universais nem nas
coisas e nem no pensamento. O universal é puro nome (flatus vocis).
Conceitualismo: Os universais são
apenas conteúdos da nossa mente, representações das coisas no intelecto.
2.3. 3º PROBLEMA: QUAL É A ORIGEM DO
CONHECIMENTO?
Ao
longo da história da filosofia houve muitas posições sobre a fonte do
conhecimento. Uns dizem que é a razão, outros que é a experiência. Vejamos
quais são as principais fontes.
Racionalismo: A
fonte do conhecimento é o pensamento, a razão.
Conhecimentos verdadeiros devem ser lógicos e universalmente válidos.
Empirismo: A
fonte é a experiência, não há conteúdos a priori na mente do cognoscente. Todos
os conceitos gerais e abstratos procedem da experiência.
Intelectualismo:
Admite a participação da razão e da experiência na produção do conhecimento. Há
juízos logicamente necessários e universalmente válidos. O conhecimento é
tirado da experiência, mas julgados com conteúdos da razão.
Apriorismo:
Admite também a participação da razão e da experiência na produção do
conhecimento, mas a mente possui elementos a priori, independentes. A
experiência preenche estas formas.
2.4. 4º PROBLEMA: COMO PODEMOS VERIFICAR O
CONHECIMENTO?
A
Teoria do Conhecimento tem como tarefa também discutir critérios para verificar
a validade de um conhecimento.
Princípio
cartesiano: Uma ideia é verdadeira, quando é clara, simples, distinta e
indubitável.
Princípio
da coerência: As inferências devem ser inferidas a partir
de postulados verdadeiros.
Princípio
da autoridade: Postula a existência de uma fonte infalível
de conhecimento.
Princípio
pragmático: Um conhecimento é verdadeiro quando passa
pela prova da experiência e auxilia na resolução de problemas.
Princípio
da conformidade: Um conhecimento é verdadeiro quando há
adequação entre a proposição verbal e a realidade descrita.
3.
ANÁLISES
DAS PRINCIPAIS TEORIAS DO CONHECIMENTO
3.1. DESCARTES E O RACIONALISMO
Descartes construiu um sistema científico
de bases ou princípios firmes e indubitáveis.
Sua ideia sobre o conhecimento é toda racionalista com base no modelo
matemático. A ciência deveria de princípios metafísicos e a partir dos quais
com rigor e ordem seriam deduzidos os conhecimentos restantes.
O pensador tinha como objetivo a reforma
do conhecimento humano por causa da desconfiança com razão presente em sua
época. Ele pretende, então, aplicar o
modelo matemático a campos como da metafísica e da física.
O saber tradicional para Descartes
sustentava-se sobre bases frágeis e carecia de organização e sistematicidade. O
princípio para garantir o conhecimento deve ser evidente, claro e distinto a
ponto de ser indubitável.
Descartes descreve um método para a busca
da verdade: A) Não se pode aceitar aquilo que não for absolutamente
indubitável. O verdadeiro é evidente e indubitável. B) A dúvida é purificadora
porque ajuda a rejeitar os princípios falsos que podem induzir ao erro. C) O
conhecimento seguro tem de passar rigorosamente pelo crivo da dúvida.
3.2. LOCKE E O EMPIRISMO
John Locke rejeita a existência de ideias
inatas. Ele dá o exemplo do comportamento das crianças que não demonstra já ter
ideias. Para o filósofo, o ser humano
nasce com a mente vazia, em contato com a realidade, ele vai a preenchendo com
os dados da experiência, estes são as ideias.
Experiência é tudo o que pode ser
apreendido de modo imediato pela mente. E possui um sentido interno (reflexão)
e outro externo (sensação).
3.3. KANT E O CRITICISMO
Kant faz uma crítica do racionalismo e do
empirismo. Empírico ou a posteriori (dados oferecidos pela experiência).
Puro ou a priori (não depende de nenhuma experiência sensível e
distingue-se do conhecimento empírico pela universalidade e necessidade.
A experiência sensível por si só jamais
produz juízos necessários e universais. Todas as vezes em que se está diante
desse tipo tem-se um conhecimento puro ou a priori. Por exemplo
na proposição “a linha reta é a distância mais curta entre dois pontos”. Nessa
proposição nada se afirma a respeito de determinada linha reta, mas de qualquer
linha reta (universalidade); por outro lado, não se declara que a linha reta é
a mais curta em certas condições, mas sem quaisquer condições (necessidade).
3.4. NIETZSCHE E SUA TEORIA DO CONHECIMENTO
“Não há fatos, há interpretações”. Nietzsche
afirma uma radical contingência do conhecimento. Ele critica a busca por conceitos universais,
verdades. Os conceitos são criados historicamente. A finalidade do ato de
conhecer é buscar respostas úteis à conservação da espécie.
- VERDADE
A verdade é a concordância do pensamento
consigo mesmo. Um juízo é verdadeiro quando construído segundo as leis e normas
do pensamento. De acordo com essa concepção, a verdade significa algo puramente
formal. Ela coincide com a correção lógica.
A verdade do conhecimento só pode consistir,
portanto, na produção de objetos em conformidade com as leis do pensamento,
vale dizer, na concordância do pensamento com suas próprias leis (HESSEN).
- REFERÊNCIAS
MONDIN,
B. Introdução à Filosofia:
O problema gnosiológico. São Paulo: Paulinas, 1980.
CERRUTTI,
Pedro. A caminho da verdade suprema.
Rio de Janeiro: Universidade Católica, 1968.
HESSEN,
JOHANNES. Teoria do Conhecimento.
Trad. de João Vergílio G. Cuter. Martins Fontes: São Paulo, 2000.
MOSER,
P.; MULDER, D.; TROUT, J. A teoria do
conhecimento. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
[1] Texto-base para as
aulas de Teoria do Conhecimento no curso de Complementação de Estudos em
Filosofia do Instituto de Ciências Humanas João Paulo II (IJOPA) / Faculdade
Católica de Anápolis, Caratinga, 2013.
[2] Bacharel em filosofia
pela Faculdade João Calvino (2010) e licenciado em filosofia pela Faculdade de
Ciências da Bahia (2011), especialista em Docência do Ensino Básico e do Ensino
Superior (2011), atual Secretário Municipal de Educação de Conceição de Ipanema
(MG). E-mail: joaristides@gmail.com.
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