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sexta-feira, 11 de abril de 2025

O problema da linguagem de Agostinho até Tomás de Aquino

 FILOSOFIA DA LINGUAGEM: DE AGOSTINHO A TOMÁS

 

1 - TEORIA DA LINGUAGEM DE AGOSTINHO

 

Santo Agostinho (354-430 d.C.), um dos mais influentes filósofos da Idade Média, desenvolveu uma teoria da linguagem complexa e multifacetada, explorando a natureza dos signos, a origem da linguagem e a relação entre pensamento e linguagem. Suas ideias, expressas em obras como "De Magistro" e "Confissões", continuam a influenciar a filosofia da linguagem até hoje.

Principais ideias de Agostinho sobre a linguagem:

a)    A linguagem como sistema de signos:

     Agostinho via as palavras como signos, ou seja, entidades que representam outras coisas. Ele explorou a natureza dos signos e como eles funcionam para comunicar significado. Para ele, as palavras eram ferramentas para abrir novos conteúdos de conhecimento, essenciais para a argumentação filosófica e teológica.

b)   A origem da linguagem:

     Em "Confissões", Agostinho descreve sua teoria da aquisição da linguagem, na qual as crianças aprendem a associar palavras a objetos por meio da observação e repetição. Essa teoria, conhecida como teoria ostensiva da aprendizagem linguística, foi criticada por Wittgenstein, mas ainda é relevante para a discussão sobre a aquisição da linguagem.

c)    A relação entre pensamento e linguagem:

     Agostinho argumentava que o pensamento precede a linguagem e que as palavras são usadas para expressar os pensamentos internos. Ele introduziu o conceito do "verbo interior", a ideia de que o pensamento é uma forma de linguagem interna que precede a linguagem externa. O conceito é a palavra interior ou verbo interno. Na realidade, o que se quer comunicar é o verbo interior, e por isso usamos os verbos exteriores, orais ou escritos.

d)   A finalidade da linguagem:

     Seguindo os estoicos, para Agostinho a linguagem tem como finalidade ensinar ou recordar. De fato, para ele, ensinar e recordar se identificam, de acordo com a teoria do conhecimento como recordação (anámnese) que toma dos neoplatônicos.

e)    A natureza do significado:

     Agostinho explorou a natureza do significado, distinguindo entre o significado das palavras e a referência dos objetos que elas representam. Ele também reconheceu a distinção entre uso e menção, ou seja, entre usar uma palavra para se referir a um objeto e usar uma palavra para se referir a si mesma.

f)    A linguagem como ferramenta para o conhecimento:

     Agostinho via a linguagem como um meio de entender e interpretar a realidade, mas não como a fonte do conhecimento em si. Ele argumentava que o conhecimento verdadeiro vem da iluminação divina, do "mestre interior" que habita em cada pessoa.

Em resumo, Agostinho desenvolveu uma teoria da linguagem sofisticada e influente, que explorou a natureza dos signos, a origem da linguagem, a relação entre pensamento e linguagem, e a natureza do significado.

 

2 - A LINGUAGEM DURANTE A IDADE MÉDIA

 

Durante a Idade Média, a filosofia da linguagem passou por um desenvolvimento significativo, com filósofos explorando as complexidades da linguagem e sua relação com o pensamento e a realidade. Selecionamos as principais ideias sobre a linguagem deste período:

 

a)      A relação entre linguagem e pensamento: Filósofos como São Tomás de Aquino enfatizaram a conexão intrínseca entre linguagem e pensamento. Eles argumentaram que as palavras são sinais de conceitos mentais e que esses conceitos, por sua vez, refletem a realidade. A ideia do “verbo mental” ou conceito como intermediário entre o signo linguístico externo e o objeto significado foi uma contribuição de Santo Tomás de Aquino, tomando ideias de Aristóteles e Santo Agostinho.

b)     A teoria da suposição: A teoria da suposição, que examina como os termos se referem a coisas em diferentes contextos, foi um tema central na lógica medieval. Filósofos como William de Sherwood e Pedro Hispano desenvolveram classificações elaboradas de suposição, distinguindo entre diferentes tipos de referência.

c)      As formas de significação: A teoria dos modos de significação, que explora como as palavras adquirem significado por meio de suas relações com outras palavras em uma frase, também foi uma área de interesse. São Tomás de Aquino reuniu a tradição dos "modi significandi" ou "modistae" com os estudos das "proprietates terminorum". Os “modi significandi” correspondem aos modos de compreender e estes aos modos de ser.

d)      A distinção entre significância e suposição: Os filósofos medievais distinguiam cuidadosamente entre o significado de um termo (seu significado geral) e sua suposição (sua referência em um contexto específico). São Vicente Ferrer, por exemplo, antecipou conceitos da filosofia analítica moderna ao separar claramente esses dois aspectos do significado.

e)      Lógica terminista: A lógica terminista, que se concentrava na análise de termos individuais e suas propriedades semânticas, foi uma inovação importante desse período. Filósofos como William de Ockham e John Buridan contribuíram para o desenvolvimento deste ramo da lógica.

 

Em suma, os filósofos do início da Idade Média fizeram contribuições importantes para a filosofia da linguagem, explorando a relação entre linguagem, pensamento e realidade e desenvolvendo teorias sofisticadas de significado e referência.

 

3 - FILOSOFIA DA LINGUAGEM E A LÓGICA TERMINISTA

 

O estudo da linguagem na filosofia desenvolvida na Idade Média, em grande parte, se resume a uma lógica terminista. Ela se concentra no estudo e na análise dos "termos" ou palavras dentro das proposições. Diferentemente da lógica aristotélica tradicional, que se concentrava na estrutura geral dos silogismos, a lógica terminista investiga as propriedades semânticas de termos individuais e sua função dentro de frases.

Seguem alguns temas da lógica terminista:

Ø Propriedades dos termos: Os lógicos terministas estavam interessados ​​nas várias propriedades dos termos, como sua significação (o que a palavra significa em si mesma) e sua suposição (como a palavra se refere às coisas dentro de uma proposição). Eles também analisaram a cópula (a função dos adjetivos e verbos) e o apelo (a referência de um termo a algo existente).

Ø Suposição: A teoria da suposição era central para a lógica terminista. Diferentes tipos de suposição foram explorados, como suposição material (quando um termo se refere a si mesmo), suposição simples (quando se refere a um conceito) e suposição pessoal (quando se refere a indivíduos). Foram analisadas as complexidades de como os termos mudam de significado e referência dependendo do contexto da proposição.

Ø Análise da linguagem: A lógica terminista envolvia uma análise detalhada da linguagem, prestando atenção às sutilezas da gramática e da semântica. Ela procurou esclarecer as ambiguidades e paradoxos que surgem do uso da linguagem natural.

Ø Nominalismo: Muitos lógicos terministas se inclinaram para o nominalismo, a ideia de que universais (conceitos gerais) são simplesmente nomes ou conceitos mentais, em vez de entidades reais. Essa abordagem influenciou sua análise de suposição e sua compreensão de como os termos se referem às coisas.

Ø Inovações: A lógica terminista medieval trouxe inovações ao campo da semântica e abriu caminho para desenvolvimentos posteriores na lógica e na filosofia da linguagem.

 

     Os filósofos medievais contribuíram significativamente para o desenvolvimento da lógica terminista, especialmente durante o final da Idade Média. São:

 

Ø  Guilherme de Ockham (1295-1349): Ele é considerado um dos principais expoentes do nominalismo e teve grande influência na lógica terminista. Ele fez uma análise profunda dos termos e suas propriedades, especialmente a suposição. Seu foco na linguagem e na lógica influenciou o desenvolvimento posterior da filosofia da linguagem.

Ø  Walter Burley (1274/1275-pós 1345): Ele também fez contribuições importantes para a lógica terminista, especialmente no estudo da suposição. Sua obra foi caracterizada pelo rigor formal e pela defesa da lógica tradicional contra inovações nominalistas.

Ø  John Buridan (c. 1358 ou 1366): Ele foi outro importante lógico terminista que trabalhou na tradição nominalista de Ockham. Ele fez uma análise detalhada da suposição e outras propriedades dos termos. Suas obras tiveram grande influência na lógica posterior.

Ø  Pedro Hispano (1205-1277): Seu "Tractatus" ou "Summule logicales" foram de grande importância para o desenvolvimento da lógica terminista. Em suas obras, ele discute as propriedades dos termos significação, suposição e cópula.

Ø  Guilherme de Sherwood (1200/1210-1267): Ele é visto como o grande sistematizador de muitos elementos dispersos. Em suas obras, as propriedades dos termos significado, suposição, cópula e apelo são bem detalhadas.

 

4 - LINGUAGEM E SIGNIFICAÇÃO EM TOMÁS DE AQUINO

 

Tomás de Aquino (1225-1274), um dos maiores filósofos da Idade Média, desenvolveu uma teoria da linguagem que buscava integrar as tradições filosóficas gregas e medievais. Sua abordagem, profundamente influenciada por Aristóteles e Agostinho, explorou a relação entre linguagem, pensamento e realidade.

Principais ideias de Tomás de Aquino sobre a linguagem:

a)      O conceito como mediador:

v  Tomás de Aquino via o conceito, ou "verbo mental", como um intermediário entre a palavra e a coisa. Essa ideia, inspirada em Aristóteles e Agostinho, enfatiza o papel do pensamento na significação.

v  A palavra é um signo do conceito, que por sua vez é um signo da coisa. Assim, a palavra nos leva a compreender o conceito, que nos conduz ao objeto.

b)      Significatio, suppositio e modi significandi:

v  Tomás de Aquino integrou as teorias dos "modi significandi" (modos de significar) e das "proprietates terminorum" (propriedades dos termos).

v  Os "modi significandi" exploram como as palavras adquirem significado em relação a outras palavras na oração.

v  As "proprietates terminorum" analisam as propriedades semânticas dos termos, como a significação (o conteúdo da palavra) e a suposição (a referência da palavra no contexto).

v  Tomás de Aquino também explora a copulação, que é a capacidade dos adjetivos de serem predicados.

c)      A semântica da proposição:

v  Tomás de Aquino aprofundou a análise da semântica da proposição, explorando a relação entre sujeito (S) e predicado (P).

v  Ele combinou as relações de inerência e identidade, argumentando que S e P se relacionam como matéria e forma, indicando tanto identidade material quanto distinção formal.

v  Tomás de Aquino rejeita a teoria da identidade nominalista, e se aproxima de conceitos que serão propostos por Frege e Russel.

d)      A importância da linguagem:

v  Para Tomás de Aquino, a linguagem humana é um sistema de signos sensíveis pelos quais o homem transmite mensagens de caráter espiritual.

v  A linguagem tem a missão de conduzir o ser humano para além do meramente transitório.

Tomás de Aquino desenvolveu uma teoria da linguagem que buscava integrar as tradições filosóficas gregas e medievais. Sua abordagem, que enfatizava o papel do pensamento na significação e explorava as complexidades da semântica proposicional, teve um impacto duradouro na filosofia da linguagem.

 

ANEXO

 

TABELA SOBRE LINGUAGEM NA IDADE MÉDIA

 

AUTOR

IDEIAS SOBRE LINGUAGEM

01

Porfírio de Tiro

Questionou se gêneros e espécies são realidades subsistentes ou conceitos mentais.

Levantou o problema da relação entre nomes e coisas.

02

Severino Boécio

Defendeu que universais são entes reais e incorpóreos.

Argumentou que universais são essências imanentes aos objetos concretos.

Considerou universais como ideias de Deus, com influência platônica.

03

Pedro Abelardo

Adotou o nominalismo, vendo universais como nomes e noções, não coisas reais.

Argumentou que termos gerais são predicados lógicos, não substâncias.

Desenvolveu o conceitualismo, vendo universais como conteúdo do pensamento com significados lógicos.

04

Guilherme de Ockham

Defendeu o nominalismo extremo, vendo universais como criações mentais sem existência real. Desenvolveu o conceitualismo, considerando universais como entidades mentais.

Criou a teoria da suposição (material, pessoal, simples) para explicar como termos substituem objetos em proposições.

 

Filosofia da Mente no estoicismo e no epicurismo

 FILOSOFIA DA MENTE NO ESTOICISMO E NO EPICURISMO

 

CORPO E MENTE NO ESTOICISMO

 

Os estoicos consideravam a alma corpórea segundo sua física são corpóreos que é capaz de agir e receber ação. A alma torna as coisas vivas e imprime-lhes movimento. Já o espírito (pneuma) é um corpo sutil. Ele age sobre as coisas macroscópicas e as torna estáveis e substanciais.

 

Corpo (soma, somatika):

v  É a matéria física, extensa em três dimensões e com resistência.

v  É constituído pelos quatro elementos: terra, água, fogo e ar.

v  É a parte tangível e visível do ser vivo.

v  Na visão estoica, o corpo é inseparável da alma (psuche) em um ser vivo, formando uma mistura total.

 

Pneuma:

v  É uma substância corpórea sutil, de natureza ígnea ou aérea.

v  Permeia todo o cosmos, unindo e sustentando todas as coisas.

v  Manifesta-se em diferentes graus de tensão e movimento, desempenhando diversas funções:

ü  Hexis: Coesão e sustentação em objetos inanimados.

ü  Phusis: Crescimento, nutrição e reprodução em plantas.

ü  Psuche: Impulso, percepção e automovimento em animais.

v  É o princípio ativo que confere qualidades e estabilidade aos corpos.

v  Pneuma é o elemento que possibilita a vida.

 

Psuche (alma):

v  É um tipo específico de pneuma, responsável pelas funções psicológicas e vitais dos animais.

v  É o princípio que anima o corpo, e sua separação do corpo resulta na morte.

v  Em animais racionais (humanos), a psuche possui uma parte racional (hegemonikon) que governa as outras partes.

v  A psuche é responsável por funções como percepção, impulso, assentimento e razão.

v  A psuche se desenvolve da phusis.

 

A MATERIALIDADE DA ALMA NO EPICURISMO

 

Epicuro, em sua busca por uma compreensão materialista do mundo, também abordou a natureza da alma. Suas principais características são:

 

v  Composição Atômica:

ü  A alma, assim como tudo no universo, é composta de átomos, mas de um tipo particularmente fino e sutil.

ü  Essa natureza corpórea é crucial para Epicuro, pois permite que a alma interaja com o corpo físico.

v  Mortalidade:

ü  A alma não sobrevive à morte do corpo. Sua estrutura delicada se desintegra quando o corpo perde a capacidade de sustentar a vida consciente.

ü  Essa visão elimina o medo da morte e de punições pós-vida, um ponto central da filosofia epicurista.

v  Sede da Sensação:

ü  A alma é responsável pelas sensações (aisthêseis) e pelas experiências de prazer (hêdonê) e dor (algêdôn).

ü  Essas sensações são os guias fundamentais para o que é bom e ruim, pois todos os seres sencientes buscam naturalmente o prazer e evitam a dor.

v  Parte Racional e Irracional:

ü  Epicuro distingue entre uma parte irracional da alma, distribuída por todo o corpo e responsável pelas sensações básicas, e uma parte racional, localizada no peito e responsável pelas funções intelectuais superiores.

ü  A parte racional é onde ocorrem os erros de julgamento, enquanto a sensação pura é considerada incorrigível.


v  Interação com o Mundo:

ü  A alma interage com o mundo através de "simulacros", finas películas de átomos emitidas pelos objetos.

ü  Esses simulacros penetram nos órgãos sensoriais e na mente, gerando sensações e pensamentos.


v  Liberdade Limitada:

ü  Embora os átomos se movam de acordo com leis fixas, Epicuro introduz a ideia de um "desvio" atômico aleatório (clinamen) para explicar a liberdade de vontade.

ü  Este desvio atômico é um ponto de indeterminação no universo.


v  O problema da linguagem:

A linguagem pode ser uma barreira para o pensamento correto, pois ela pode sugerir que a morte (estar morto) é algo 
 

Bibliografia

ARANHA, M. L. A. & MARTINS, M. H. P. Filosofando: introdução à filosofia. 3ª ed. Rev. atual. São Paulo: Moderna, 2003.

CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da Filosofia: Dos pré-socráticos a Aristóteles. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

MONDIN, B. Introdução à Filosofia: problemas, sistemas, autores, obras. 12ª ed. São Paulo: Paulus, 2001